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28/11/2024

NOTA DE REPÚDIO CONTRA AS DECLARAÇÕES SOBRE O SISTEMA DE COTAS PROFERIDAS NO ÂMBITO DO PODER JUDICIÁRIO DA BAHIA

Em pleno mês da Consciência Negra, em sessão de julgamento do Tribunal de Justiça da Bahia, datada de ontem, a Desembargadora Rosita Falcão afirmou que “as cotas vieram mais para desunir do que unir a população”. O julgamento versava precisamente sobre a inclusão ou não de uma candidata aprovada como cotista em concurso do próprio TJ-BA.

A desembargadora complementa dizendo que “a meritocracia é importantíssima no serviço público”, comparando, inclusive, a qualidade da educação pública antes e depois da implementação do sistema de cotas ao tecer a crítica de que “a Federal de Direito era excelente, hoje já não é tanto, porque todos os professores comentam o desnível dos estudantes. O nível dos estudantes baixou”.

Repudiamos a fala da Desembargadora Rosita Falcão pelo seu evidente conteúdo de discriminação racial ao associar os problemas enfrentados pela educação pública brasileira ao fato de hoje possuir uma maior composição de estudantes negros. Associação esta feita sem qualquer fundamentação estatística, de modo que eivada de preconceito racial ao conferir eventual déficit qualitativo do curso de Direito da Universidade Federal da Bahia a um suposto desmérito dos alunos negros que o integram.

Sabemos que as dificuldades enfrentadas pela educação pública são de origens diversas e perpassam, principalmente, pelo investimento insuficiente, resultando em má remuneração dos professores e servidores (vide a greve das Universidades Federais ocorrida em 2024), incentivo reduzido à pesquisa, extensão, assistência social, entre outros. Por outro lado, o discurso que as cotas atuariam promovendo uma desunião da sociedade é um fechar de olhos para a nossa história econômica e social passada e presente.

Tal se torna ainda mais evidente quando falamos do estado da Bahia pois, conforme dados de 2022 da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), levantados a partir da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios do IBGE, 80,8% da população baiana se declara negra (entre pretos e pardos). Contudo, sabemos que este percentual não está refletido, nem de longe, na proporção de pessoas negras ocupando cargos públicos, principalmente nas esferas mais elevadas tal como as do sistema de justiça, nem tampouco no âmbito do ensino público superior federal.

A título exemplificativo, o Diagnóstico étnico-racial elaborado pelo CNJ em 2023, apontou que apenas 41,8% dos Magistrados e Magistradas e 65, 1% dos servidores do TJBA se declaram negros e negras. Atenta-se que o Tribunal de Justiça da Bahia possui implementado, desde 2015 (Resolução nº12/2015), o sistema de cotas para o concurso do quadro de pessoal, incluindo o cargo de juiz, reservando 30% das vagas para a população negra e, ainda assim, a desproporção quando comparado ao contingente populacional é gritante.

Logo, entendemos que inverídico afirmar que as cotas atuam promovendo a desunião social quando esta é uma realidade herdada do nosso passado histórico de quase quatro séculos de escravidão, o qual eliminou qualquer possibilidade de uma meritocracia justa.

Reconhecemos nas cotas raciais uma importante política pública de reparação histórica junto à população negra e que está em conformidade com os compromissos assumidos pelo Brasil internacionalmente ao ratificar a Convenção sobre Eliminação de Todas as formas de Discriminação Racial das Nações Unidas; bem como em acordo com o princípio constitucional de vedação à discriminação racial.

Por tudo isso, a Adep Bahia repudia todo e qualquer discurso ou prática de discriminação racial. Racismo é crime!

Salvador, 28 de novembro de 2024

Associação das Defensoras e Defensores Públicos da Bahia